Doleiro envolvido no caso Siemens tem tratamento diferenciado pela Operação Lava Jato

Circula hoje nos jornais, com discrição, que a Polícia Federal concluiu o inquérito sobre o "cartel metroferroviário" que operou em São Paulo entre 1998 e 2008. São indiciados 33 pessoas por corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, formação de cartel e crime licitatório. Entre os indiciados há servidores públicos, doleiros, empresários e executivos de multinacionais envolvidos. O que é de se estranhar é o fato de Raul Srour, doleiro envolvido na Operação Lava Jato, que já fez delação premiada no caso do Banestado e hoje é envolvido com denúncias de propina no caso da empresa Siemens, recebeu tratamento diferenciado ao do Alberto Youssef, pois foi solto em condições camaradas, sem fazer acordo de delação premiada – que se saiba – no que diz respeito a coisa maiores não foi investigado, como a empresa nas Ilhas Virgens Britânicas que recebeu dinheiro de propina dos envolvida no caso Siemens.

No dia 6 de dezembro de 2013, Mark William Gough, vice-chefe e diretor da Siemens AG, responsável por evitar internamente casos de corrupção, veio da Alemanha prestar depoimento voluntário na sede do Ministério Público Federal em São Paulo, colaborando com investigações sobre o pagamento de propinas para autoridade do governo tucano paulista em contratos relativos aos trens metropolitanos de São Paulo.

Gough contou que a Siemens foi alvo de uma grande investigação mundial sobre ilícitos praticados em diversos países, e a partir de 2007 passou a fazer também uma investigação interna. Em 2008, um empregado da empresa no Brasil denunciou uma conta bancária em Luxemburgo que seria usada para movimentar um caixa 2 para pagamento de propinas e desvios por meio de paraísos fiscais. O banco era o Itaú e esta conta acabou motivando a demissão do então presidente da filial brasileira, Adilson Primo.

A investigação descobriu que, em 2003 e 2004, empregados de alto escalão da Siemens no Brasil autorizaram a transferência de cerca de US$ 7 milhões provenientes de contas legítimas e contabilizadas nos Estados Unidos e Alemanha para uma conta irregular no Itaú de Luxemburgo, controlada por eles mesmos, através de empresas possivelmente de fachada criadas na Europa e no Caribe.

No começo de 2011, Gough pediu à procuradoria de Luxemburgo abertura de investigação criminal, pois o extrato tirado no banco Itaú do paraíso fiscal "era  totalmente incompreensível. Era o extrato bancário mais confuso que o depoente já viu na vida, sem nenhuma descrição de transações, mas apenas valores", segundo depoimento de Gough ao Ministério Público Federal (MPF).

Na Procuradoria de Luxemburgo as investigações avançaram, seguindo o caminho do dinheiro, com a quebra do sigilo bancário. Parte do dinheiro foi parar na conta da empresa Cristal Financial Services, sediada no paraíso fiscal das Ilhas Virgens Britânicas, cujos proprietários são Raul Henrique Srour e Richard Andrew de Mol Van Otterloo. Ambos foram condenados como doleiros no âmbito do caso Banestado a penas leves por aceitarem fazer delação premiada. Apesar de movimentarem cerca de US$ 1 bilhão como doleiros entre 2000 e 2003, suas penas foram reduzidas à doação de 50 cestas básicas e um ano e nove meses de prestação de serviços comunitários.

Raul Henrique Srour, tido como integrante do grupo de Alberto Youssef, foi novamente flagrado operando como doleiro na recente Operação Lava Jato. Dentro da estratégia de dividir as denúncias, o Ministério Público Federal do Paraná rapidamente ofereceu à Justiça uma primeira denúncia contra ele no dia 24 de abril de 2014, restrita ao crime de fraude ao usar nomes de terceiros para realizar operações de câmbio e para comprar um carro. A denúncia faz menção à conta dos executivos da Siemens no Itaú de Luxemburgo, mas apenas como indício de crimes antecedentes, sem aprofundar nada sobre o assunto.

Em junho de 2014, o juiz Sérgio Moro concedeu liberdade provisória à Raul Srour mediante fiança que teve o valor de R$ 7,2 milhões fixados inicialmente reduzido para R$ 2 milhões, sendo R$ 200 mil de entrada e mais 18 mensalidades de R$ 100 mil. O parcelamento é de difícil compreensão no caso de fiança, já que o fundamento seria a perda da caução em caso de fuga e retirar do acusado meios para continuar operando no mercado ilegal de câmbio. Porém, o parcelamento dá a chance do suposto criminoso pagar só a entrada de 10%, fugir e dar o calote no restante.

Outro ponto de se estranhar é o fato de Raul Srour ter recebido tratamento diferenciado ao do Alberto Youssef, pois foi solto em condições camaradas, sem fazer acordo de delação premiada – que se saiba – no que diz respeito a coisa maiores, como a empresa nas Ilhas Virgens Britânicas envolvida no caso Siemens.

No depoimento de Mark Gough, feito há um ano. está registrado: "O depoente informa que as autoridades de Luxemburgo estão interessadas em entrar em contato com as autoridades brasileiras".

Passado um ano, só agora uma delegação de procuradores brasileiros viaja para a Suíça em busca de provas sobre contas usadas para suposta lavagem de propinas nos contratos de trens paulistas.

Em 2013 o ex-diretor da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) João Roberto Zaniboni foi condenado pela Justiça suíça por lavar dinheiro de propina no país europeu. Aqui no Brasil, ele e os demais envolvidos no escândalo do governo tucano continuam soltos.


* Matéria publicada no portal Rede Brasil Atual