Entrevista com Marcos Kyoto sobre transporte na cidade de São Paulo
Diante do caos vivido nos congestionamentos de São Paulo, o Plataforma entrevistou o arquiteto, mestrando em transporte público pela Faculdade de Arquitetura da USP e consultor da TC Urbes na área de transportes de alta capacidade, Marcos Kyoto, para compartilhar ideias sobre a emergente necessidade da construção de transporte de alta capacidade na cidade. Confira os principais trechos da entrevista.
O planejamento de transporte deveria ser feito como algo parecido com uma teia de aranha…
O ideal é ter uma rede, sem ter um eixo. Aí sim você está debatendo planejamento. Quando você estica uma linha, não! E você precisa fazer com critério e prioridade. Deveria haver uma continuidade de projetos, independente de mandatos. Mas os próprios Alckmin e Serra não dão continuidade às políticas e projetos entre eles! Ao final da gestão de Alckmin, serão 20 anos no poder, mas sem continuidade. Aconteceram mudanças atrás de mudanças.
Então o planejamento ainda está engatinhando?
É! Aqui nós temos a linha Azul e a Vermelha. As duas se cruzam no meio. Tínhamos uma diretriz muito clara. O resto das coisas deveria girar em torno disso. Mas isso nunca aconteceu! Por exemplo, a Linha Amarela está prevista desde 1968, quando fundaram o Metrô, e com a chegada dela é possível fazer a diferença com as integrações em República e na Luz, por exemplo. Vai aliviar a Sé! Isso é uma diretriz de rede. Fazer a Linha Lilás não é, porque ela é um rabicho que não liga em nada. Isso é falta de prioridade, de planejamento. Ela está prevista há muito tempo, mas começaram pela outra ponta, o que não é muito inteligente. Inauguraram em 2001, e até agora, 10 anos depois, não conseguiram nem fazer a licitação! Isso é não saber planejar!
Com toda esta falta de planejamento, não é pior privatizar a Linha 4 – Amarela?
Eu sou contra! Deveria ser tudo estatal! O Metrô sempre construiu metrô. Não vejo problema em continuar fazendo.
Qual é a principal matriz para o transporte de São Paulo?
Tem que ter inclusive bicicleta. Agora, para o tamanho do problema de SP, deve ser de alta capacidade! Enquanto não fizer isso, não tem alternativa. Tem que ter metrô e trem. Fazendo a conta por cima, a cada 1 milhão de habitantes, SP deveria ter pelo menos 10 quilômetros de metrô. Na região metropolitana, temos 20 milhões de habitantes, então deveria ter no mínimo 200 quilômetros de metrô. Mas com a estação Butantã, passou de 70 quilômetros. Precisamos ter 3 vezes o que a gente tem hoje.
Quantos quilômetros deveríamos construir por ano?
Para 200 quilômetros em 20 anos, seriam 10 quilômetros por ano. Tem que ser pelo menos 5 vezes mais rápido do que está sendo feito hoje. E a questão não é nem se a gente consegue. A gente tem que fazer! Não é impossível! Se formos ver o ritmo de construção na China… lá eles constroem 30 quilômetros ao ano! E em outros lugares já fizeram isso. Em Paris, 80 quilômetros de metrô foram construídos em 10 anos. Eles planejaram 6 linhas e 15 anos depois eles tinhas essas 6 linhas! A gente planejou 3 e não fizemos as 3.
Como você avalia o projeto de transporte de São Paulo?
Se formos analisar, desde a década de 90 havia um plano para o transporte, o PITU (Plano Integrado de Transportes Urbanos). Mas faziam e guardavam! O pontapé inicial foi com o PITU de 1996, tem o PITU 2020, que foi um plano gigantesco, de 1998, ou seja, antes deste debate todo de transportes, mas foi feito e foi engavetado! Em 1998, com horizonte de 2020! Um plano para 20 anos, o que aceitável para planejamento. Tem que haver um horizonte de 10 ou 20 anos, e não de 4 anos! Aí em 2005 lançaram o 2025, que se sobrepõe ao anterior! Então você praticamente jogou um plano fora e refaz ele! Dizem que não, que foi uma atualização, um processo contínuo, mas se você for olhar mudou tudo!
Mas desde antes disso, em 1940, quando São Paulo passou de 1 milhão de habitantes, nunca houve planejamento. O que predomina é a especulação imobiliária, os loteamentos individualizados.